Já faz mais ou menos uns dois anos. Ele mantinha o velho medo, um receio, algo que o privava de si mesmo, de uma parte sua tão grande e tão quente, por dois anos. Na sua cabeça havia uma lista de coisas, de traços, características, que ele devia procurar numa outra pessoa - estava rendido a ilusão de que só alguém parecido com o passado poderia lhe devolver o que foi tirado, ou melhor o que ele tinha decidido dar, ninguém nunca pediu nada, fez porque quis, porque era o seu jeito, ou falta de.
Nada durava muito. Tudo em vão. Até que encontrou alguém que não se parecia tanto, mas sentiu que era ela. A salvação, o remédio, a própria cura, a volta. Mentira. Mas quando percebeu já estava envolvido demais, queria fugir, continuar olhando para sua lista e buscar o passado. Acabou mantendo. Ficando. Se acomodando. Sabia que não estava certo, que não devia fazer isso com alguém, nem com ele mesmo - talvez fosse pior para ele mesmo. Era frio. Controlado. Um pouco egoísta.
Sua sorte foi que ela não o abandonou, não o temeu. Ela sabia que só ia vencê-lo se entregando, mais que isso, ela tinha certeza que havia alguém ali, um outro ali, que ele não era ele, que ele precisava dele. Encarou aquilo como uma missão. Estava tudo em suas mão, ela sabia desde o inicio. A fragilidade era dele. Medo, dele. Fuga, dele. Desespero, dele. Ela, dela. Amor, deles.
Difícil. A vontade era de, com uma broca, perfurar aquele peito e voltá-lo a vida novamente. Entrar naqueles olhos e entender o que se passou, encontrar um mapa para o que fora escondido. Paciência. Ela estava indo bem, tava mandando ver bonito! Ela sabia.
Ele passível, passível, passava pelo tempo como se o próprio tempo fosse ele.
Ela sempre acima, tudo sob controle. Se conseguisse trazê-lo de volta, pronto. Ele seria dela. Han? Dela? Não! Erro. Ele devia ser dele. Ela se enganou, ela não percebeu. Ela se acabava assim. Ela se dava. Ela se esquecia de si. Não, assim não! Desmoronava. Uma coisa tão bonita, uma dedicação tão pura. Ela ia sumindo. E só ia sobrando ele, quer dizer, aquela parte dele.
Ela não podia mais. Não dá mais. Percebeu que dela pouco sobrava, com ela ele pouco se importava. Se deixou levar. E levaram.
Outra vez? Mais isso agora? Mais de mim vai embora? Ele se perguntava. Se dando conta de que NÂO! Mais dele estava voltando, chegando, de que era sua vez. Ele tinha que fazer alguma coisa, ele podia, devia, fazer alguma coisa, porra!
Era ela, e não é mais. Não era ele, mas agora é. Ele é dele e ela é dela. E deles...