terça-feira, 30 de novembro de 2010

Quantos nascerão dos mortos?

Ao fim de novembro de 2010 a sociedade brasileira teve a oportunidade – esperamos - única de presenciar um dos episódios mais conturbados, conflitantes e penosos, principalmente, ao povo do Rio de Janeiro.

Quase 3 mil homens, entre policiais militares e civís e membros das forças armadas, protagonizaram a ação sobre morros cariocas na caça de traficantes e seus laranjas, após a promoção de diversos ataques e afrontas à ordem pública. Especialistas afirmaram que o apoio e a visão da população sobre as forças do Estado, colocando-os num status de heróis, é inédita em toda a história do país. Por alguns dias o povo não temeu a polícia, mas se entregou aos seus braços e respaldou seus atos.

Sem dúvida diversas críticas poderiam ser tecidas à operação de intervenção morro acima orquestrada pela polícia e a mídia (só agora era preciso fazer algo? Antes o reduto dos criminosos ainda não era conhecido? Depois da Copa e das Olimpíadas a paz vai continuar? Só polícia no morro basta, ou tem que dar educação, cultura, saúde...?). No entanto, quero me ater somente ao "pós-operatório", o famoso "e agora?".

Estranhamente uma ação que contou, como dito antes, com cerca de 3 mil homens lutando contra centenas de bandidos determinadamente relutantes em se entregar é primeira página e destaque de jornais, telejornais, sites e revistas, como um sucesso, a conquista da paz, um exemplo de intervenção militar, a vitória da sociedade civilizada sobre os brutos da desordem. Mas afinal, quantos morreram? Até agora nenhum jornalista mostrou a cara pálida frente as câmeras e divulgou o número de mortos. A única matéria divulgada nos grandes meios que cita a falta deste número foi uma da Folha.com, cujo título é: "Polícia destruiu TVs, dizem moradores do Complexo do Alemão", ou seja, o dado sobre o número de mortos nem destaque é. Segundo a reportagem, moradores das favelas afirmam que 60 homens foram mortos na fuga da Vila Cruzeiro, na quinta-feira passada, e que os corpos estariam espalhados pela mata da rota de fuga que tem seu acesso, coincidentemente, impedido pela polícia.

É óbvio que desmantelar a estrutura criminosa dos traficantes não é coisa fácil e que vidas iriam ser perdidas, sangue iria ser derramado, mas já que o assunto foi tão explorado, principalmente pela Rede Globo, durante os plantões de notícias da TV que o máximo de informações fosse repassada a população. Que a realidade venha à tona. Policiais, BOPE, fuzileiros, soldados, etc. NÃO SÃO HERÓIS e traficantes, laranjas, aviõezinhos NÃO SÃO VILÕES. O sistema, o mundo, a rede, enfim, o lugar onde vivemos é muito mais complexo do que isso. Tipificar ou rotular os agentes dessa batalha entre mocinho e bandido, bem e mau, é ignorar todo o histórico de desigualdade e de necessidades não atendidas, pelo Estado "Democrático de Direito", de uma população miserável.

Não vamos esquecer ou ignorar que, apesar do êxodo de criminosos, ainda existem famílias inteiras vivendo em condições calamitosas, que existem crianças, algumas que passarão o Natal e o resto da vida órfãs, como o filho de um segurança baleado ao sair de casa no Alemão para distribuir convites da festinha de aniversário de um ano do filho, que não têm culpa de estar no lugar onde estão e da condição a que respondem. O dever não foi cumprido, a morte e os mortos ainda vão continuar assombrando aqueles bolsões de pobreza e descaso por algum tempo se nada mais for feito.

Há dez anos, após o sequestro do ônibus 174, promovido por um jovem que quando criança presenciou a chacina da Candelária, ocorrida também no Rio em 1993, culminou na morte deste e de outra inocente. Lembremos. E que algo seja feito para que daqui alguns anos jovens sedentos de vingança com as imagens dessa guerra guardadas em sua memória não precisem expressar sua raiva pela violência, mas que tenham a oportunidade de trilhar diferentes caminhos.

quarta-feira, 24 de novembro de 2010

É só o começo!

CARTA ABERTA ENVIADA PELO GRUPO INTERAÇÕES - UNESP BOTUCATU

Após o ocorrido na festa do dia 16/11, manifestamos nosso repúdio aos atos homofóbicos de várias formas, uma delas foi levando uma mensagem do que esperamos da sociedade. Em outra festa, no dia 18/11, usamos plaquinhas penduradas no pescoço, cada uma com um dizer: Amor, Liberdade, Igualdade, Direitos Humanos, Respeito e Paz. Claro que a aceitação não foi total, pois fomos discriminados novamente, e questionados quanto à invasão do espaço dos demais presentes na festa (??!!), e chegamos a ouvir a seguinte declaração: “a palavra respeito não significa nada para mim” (!!).

Para nossa surpresa, no dia 20/11, em outra festa, os mesmos agressores carregavam plaquinhas com os seguintes dizeres: “eu adoro cacete” e “eu preciso de um companheiro”. Mostrando que a homofobia está mais do que presente em nossa universidade, pois as plaquinhas possuem uma clara demonstração pejorativa a respeito da orientação homossexual (por exemplo, se as plaquinhas se referissem às mulheres, seria uma clara demonstração de machismo). E mostrando ainda, que nossa mensagem não foi propriamente entendida.

A intenção não era provocar ninguém, portanto obter uma manifestação em “resposta” não era nosso objetivo. Sabemos que começamos um processo, e não uma guerra. A transformação não vai ser fácil, pois construir o conceito de respeito em alguém, não é algo tão simples, mas estaremos aqui, fazendo o possível pela igualdade entre tod@s! Mesmo que seja preciso escrever um relato por dia, não deixaremos nenhuma forma de discriminação passar despercebida, é hora de dar um basta a tudo isso!



Grupo Interações – UNESP Botucatu

“E se tudo isso que você acha nojento for exatamente o que chamam de amor?” Caio Fernando de Abreu

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

O Abajur

Apenas a luz amarelada do abajur iluminava a beirada da cama. Ainda havia a luz do sol lá fora, mas ele fechou a porta da varanda e cobriu com a cortina azul-marinho. Desde que chegou não disse nada, nem um cumprimento sequer, jogou as pastas do trabalho sobre o sofá e foi direto ao encontro da mulher. Ela estranhou o comportamento dele. Achou melhor sentar na beirada da cama como pedido e esperar sem fazer qualquer pergunta. Desde os primeiros dias, quando passaram a morar juntos, algo estava diferente. Ela pensou que seria algo passageiro e foi cedendo, agora não sabia mais agir de outra forma.

O abajur acendeu sozinho. Isso sempre acontecia por causa do interruptor sensível e defeituoso que ficava encostado na cama. Vários dias ela acordou assustada com aquela luz sobre seu rosto. Desde menina só pegava no sono quando tudo se perdia na mais vasta escuridão, odiava dormir com a porta aberta e a luz do corredor acesa, foram anos até que sua irmã caçula se acostumasse com seu modo. Nisso ela fez questão de nunca ceder.

Ele deitou-se com cuidado e se aproximou das suas pernas, que estavam nuas até uns quatro dedos acima do joelho, ajeitou sua cabeça entre as duas coxas que eram como pequenas almofadas quentes. Recebeu carinho sobre o rosto áspero carregado da barba por fazer e quando abriu os olhos sentiu as primeiras lágrimas escorrerem, mornas, até umedecer o tecido daquelas almofadas. Preciso falar com você. Quero explicar tudo e quero que você só fale quando eu terminar. Ela sentiu uma sensação terrível, como se pequenos cristais de gelo começassem a ser bombeados pelo coração a todos os membros do seu corpo, porém fez sinal com a cabeça de que concordava com a proposta do companheiro.

— Eu não sei o que aconteceu. Quer dizer. Eu sei o que foi, mas não entendo o porquê – fechou os olhos por alguns segundo e continuou – Nossa relação é perfeita, eu não posso reclamar de você. Sempre esteve ao meu lado, me incentivou em meus projetos, se interessa pelas minhas coisas, diz que me ama com freqüência, nunca se recusou a me ouvir, como agora. Estava tudo perfeito, talvez até perfeito demais para alguém como eu. O fato é que comecei a duvidar de que eu sou capaz de receber tanto carinho, tanta dedicação...

— Você é! Perdão.

— Não sou. Já tenho a certeza. Apesar de tudo o que você me dá, eu quis mais. Deixei que meu egoísmo tomasse conta de mim e me permiti esquecer você. Mesmo te vendo, te tocando e dormindo ao seu lado me esqueci de você. Por isso, pude voltar a ser incompleto e a procurar o que faltava. Achei. Infelizmente.

Estava imersa em lembranças. Ela já havia entendido desde o inicio. Na verdade, pensava que sabia de tudo desde a noite anterior, quando sonhou que ele estava perdido em um lugar desconhecido pedindo ajuda ao céu e à terra sem poder vê-la. Ela sem poder aproximar-se. Algo a prendia, mas não eram correntes ou grades, parecia ser algo que carregava, penosamente, dentro de si. Sonhou por toda noite o mesmo sonho. Que horror! Era o que dizia a si mesmo quando levantou de manhã e foi até o espelho do banheiro lavar o rosto, enquanto ouvia o portão da garagem abrindo e a porta do carro fechando. Quer que eu pare? A pergunta fez com que ela voltasse ao quarto iluminado apenas pelo velho abajur. Fez que não com a cabeça.

— Reencontrei uma amiga dos tempos da faculdade, na época servíamos de confessionário um para o outro. Resolvi dizer o que estava acontecendo comigo. Ela foi compreensiva, se dispôs a me ajudar. Eu retribuía, ouvindo sobre seus conflitos e decepções recentes que tivera num breve casamento – nem chegaram a se casar, na verdade só juntaram os trapos, como nós – será que nos casamos sem perceber? Nos tornamos cúmplices. Qualquer problema que me atormentasse era ela quem eu procurava e vice-versa. Eu realmente achava que tinha me esquecido de você, não me lembrava.

Nossos encontros foram se tornando mais freqüentes e intensos. Nos sentíamos como dois renegados, dois incompreendidos que só compreendiam um ao outro. Era uma linda amizade, que acabou se tornando um erro. Um dia eu estava me sentindo ótimo. Minhas dúvidas pareciam estar desaparecendo, minhas preocupações diminuindo. A nuvem que pairava sobre você se dissipava. Ela me procurou para dizer que tinha ido atrás do ex e que ele, simplesmente, a ignorou. O ex já a esqueceu, não como eu havia feito com você. Essa constatação acabou com ela, a derrubou. Fiz de tudo para consolar através da conversa e da aproximação. A crise só terminou quando a razão abandonou nossos corpos ao livre arbítrio da alma. Naquele momento um vento traiçoeiro soprou a nuvem de volta ao seu território. Depois de irmos embora acho que a ficha caiu. Você voltou. Eu voltei. Não consigo mais parar de pensar em ti. De querer vir para ficar junto com você. Já faz dois meses...

— Que não transamos – ela interrompeu com calma, mas sem pedir perdão.

— Eu não consigo. Penso em você a todo instante, mas quando te vejo a consciência me proibi de continuar te enganando. Por isso estou sendo tão sincero, estou te dizendo tudo isso porque quero ser feliz novamente contigo. Eu só fui feliz com você. Me entende?

— Entendo – respondeu secando as lágrimas que caiam dos seus olhos e dos dele com as pontas dos dedos – Mas agora eu preciso de um novo abajur.

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

Não sou guru, nem mestre, nem sábio, nem pai, nem namorado
Não sou super, nem 10, nem pau-pra-toda-obra
Não sou senhor da razão, nem das horas
Sou apenas humano e me permito um pouco de arrogância, bondade, ignorância, intuição, bondade, maldade, frustração, felicidade, tristeza, gemidos de prazer e de raiva, preguiça, coragem, indiferença e falsidade. Sou sincero somente pela metade. Sou um ser que é humano