Ao fim de novembro de 2010 a sociedade brasileira teve a oportunidade – esperamos - única de presenciar um dos episódios mais conturbados, conflitantes e penosos, principalmente, ao povo do Rio de Janeiro.
Quase 3 mil homens, entre policiais militares e civís e membros das forças armadas, protagonizaram a ação sobre morros cariocas na caça de traficantes e seus laranjas, após a promoção de diversos ataques e afrontas à ordem pública. Especialistas afirmaram que o apoio e a visão da população sobre as forças do Estado, colocando-os num status de heróis, é inédita em toda a história do país. Por alguns dias o povo não temeu a polícia, mas se entregou aos seus braços e respaldou seus atos.
Sem dúvida diversas críticas poderiam ser tecidas à operação de intervenção morro acima orquestrada pela polícia e a mídia (só agora era preciso fazer algo? Antes o reduto dos criminosos ainda não era conhecido? Depois da Copa e das Olimpíadas a paz vai continuar? Só polícia no morro basta, ou tem que dar educação, cultura, saúde...?). No entanto, quero me ater somente ao "pós-operatório", o famoso "e agora?".
Estranhamente uma ação que contou, como dito antes, com cerca de 3 mil homens lutando contra centenas de bandidos determinadamente relutantes em se entregar é primeira página e destaque de jornais, telejornais, sites e revistas, como um sucesso, a conquista da paz, um exemplo de intervenção militar, a vitória da sociedade civilizada sobre os brutos da desordem. Mas afinal, quantos morreram? Até agora nenhum jornalista mostrou a cara pálida frente as câmeras e divulgou o número de mortos. A única matéria divulgada nos grandes meios que cita a falta deste número foi uma da Folha.com, cujo título é: "Polícia destruiu TVs, dizem moradores do Complexo do Alemão", ou seja, o dado sobre o número de mortos nem destaque é. Segundo a reportagem, moradores das favelas afirmam que 60 homens foram mortos na fuga da Vila Cruzeiro, na quinta-feira passada, e que os corpos estariam espalhados pela mata da rota de fuga que tem seu acesso, coincidentemente, impedido pela polícia.
É óbvio que desmantelar a estrutura criminosa dos traficantes não é coisa fácil e que vidas iriam ser perdidas, sangue iria ser derramado, mas já que o assunto foi tão explorado, principalmente pela Rede Globo, durante os plantões de notícias da TV que o máximo de informações fosse repassada a população. Que a realidade venha à tona. Policiais, BOPE, fuzileiros, soldados, etc. NÃO SÃO HERÓIS e traficantes, laranjas, aviõezinhos NÃO SÃO VILÕES. O sistema, o mundo, a rede, enfim, o lugar onde vivemos é muito mais complexo do que isso. Tipificar ou rotular os agentes dessa batalha entre mocinho e bandido, bem e mau, é ignorar todo o histórico de desigualdade e de necessidades não atendidas, pelo Estado "Democrático de Direito", de uma população miserável.
Não vamos esquecer ou ignorar que, apesar do êxodo de criminosos, ainda existem famílias inteiras vivendo em condições calamitosas, que existem crianças, algumas que passarão o Natal e o resto da vida órfãs, como o filho de um segurança baleado ao sair de casa no Alemão para distribuir convites da festinha de aniversário de um ano do filho, que não têm culpa de estar no lugar onde estão e da condição a que respondem. O dever não foi cumprido, a morte e os mortos ainda vão continuar assombrando aqueles bolsões de pobreza e descaso por algum tempo se nada mais for feito.
Há dez anos, após o sequestro do ônibus 174, promovido por um jovem que quando criança presenciou a chacina da Candelária, ocorrida também no Rio em 1993, culminou na morte deste e de outra inocente. Lembremos. E que algo seja feito para que daqui alguns anos jovens sedentos de vingança com as imagens dessa guerra guardadas em sua memória não precisem expressar sua raiva pela violência, mas que tenham a oportunidade de trilhar diferentes caminhos.
3 comentários:
Abra mais uma Serramalte, que estou sentindo muito sua falta, meu irmão. Vida longa à vida! E um abraço forte a ti.
Meu mano, não comentei do blog porque não queria alardear muito... rs... mas fui inspirado pelo seu e continuo sendo com suas palavras... abraço
Para ser honsta, nunca acreditei que tal "invasão policial" fosse feita a fim de ser uma espécie de salvamento do pessoal do morro.
Deve-se pensar no fato de que o problema na verdade mora no motivo da formação da favela.
Os fins justificaram os meios, no fim das contas.
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